quinta-feira, janeiro 31, 2019

Nunca/Nada/Ninguém

A agência onde eu trabalho fica em um dos bairros mais seletos de São Paulo. O shopping que construíram ao lado do prédio é tão elitista que não tem entrada pra pedestre, só pra carro. Ryco não anda a pé. 
Nos apartamentos de luxo acima do shopping, vivem celebridades como Luciana Gimenez e Kaká.
Da janela da copa do meu prédio, é possível ver as dezenas de mansões que assombram o local, muitas delas exatamente iguais.
Enquanto eu tomo café, mordisco uma paçoca, dou pros meus olhos uma trégua do computador, e começo a divagar.
Quase todas essas mansões tem piscina, onde nunca nada ninguém.
Nas janelas dessas casas, as únicas pessoas que eu vejo (ao menos das 10h as 19h) são as faxineiras, os seguranças e os empregados.
As crianças provavelmente estão na escola, as mães nas massagistas ou nas lojas do shopping comprando relógios de trinta mil reais. 
Os maridos, trabalhando.
Trabalhando pra manter uma casa vazia. 
Pra conservar a piscina limpa.
Pra pagar os empregados.
Acordando cedo pra fazer o mundo girar.
Fazendo serão até tarde pra que ninguém possa ouvi-los gritar.
Entulhando suas mansões xerocadas de outras pequenas cópias: iPhones, AirFryers, travesseiros da NASA.
Tudo comprado online. 
Quem tem dinheiro não tem tempo de ir a nenhum lugar.
Cabelos grisalhos dirigindo carros cinzentos nas ruas prateadas de uma cidade pálida. 
Enrolando até a hora de ir embora chegar, 
Seguimos trabalhando até nossa hora de ir embora chegar.

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