terça-feira, maio 06, 2014

Gran finale

O protagonista da peça seria interpretado por um ator que ficou famoso ao dar vida à um vampiro em uma série de filmes antigos de que eu gostava quando era criança, remontando à época em que as pessoas ainda assistiam televisão. Então, quandi fiquei sabendo que ela estava em cartaz num teatro bem perto de casa, e a história seria a respeito de como o ator, agora com 93 anos, relembraria de pontos chave de sua vida através de dezenas de personas, soube que tinha de conferir.
A estreia estava marcada parauma sexta-feira a noite, e como a bilheteria ficava no meu caminho na volta do trabalho, passei verificar se ainda haviam ingressos.
Esgotados.
Desencanei.
Minha namorada chegou. Decidimos sair jantar em uma pizzaria. A bilheteria do teatro ficava no nosso caminho. Então pensamos em já garantir ingressos para o final de semana seguinte. Um casal apareceu, querendo vender dois ingressos para a estreia, que se iniciaria dentro de poucos minutos. Eles tinham lugares melhores do que os que ainda estavam disponíveis na próxima sexta. Ficamos com eles. E pouco antes do terceiro toque, encontramos nossos assentos.
O palco se enche de fumaça. Uma nave de papel machê se arrasta saída de trás das cortinas. Um  astronauta estica um braço para fora da nave. Podemos ver seu capacete. Nascimento, chegada a um mundo novo, stanley kubrick bla bla bla. O capacete do astronauta se abre. Tem um bebe chorando ali dentro.Uma mulher nua se aproxima, recolhe a criança e sai de cena.
Um garoto vestindo farrapos passa pulando. Um homem oferece dinheiro a criança. E em seguida o garoto coloca as mãos por dentro da calça do velho. Não esperava que o espetáculo fosse tão explícito.
Os dois saem de mãos dadas.
Um adolescente entra em cena. Ele recita versos de grandes pensadores enquanto um homem mais velho lhe come por trás. Ele está de óculos, virando calmamente as páginas de seu livro, sob o som dos gemidos de seu amante.
O mais novo entra atrás de um biombo, e ao sair é interpretado por uma nova atriz. Ela é magra, tem a maquiagem borrada, usa um vestido vulgar e entra ao som de Cocaine. Mais explícito impossível. 
Em seguidas, vemos alguns dos personagens interpretados pelo famoso ator no cinema e na televisão. Um rei, um soldado, um explorador, um galã, e o já mencionado vampiro. Sempre alternando seus papéis com a puta drogada ou com o velho ator interpretando a si mesmo. Algumas vezes vezes tem três ou quatro personagens interpretando diferentes partes da psiquê do autor na mesma cena. E com ajuda de maquiagem pesada, os personagens foram envelhecendo com o passar do tempo. Algumas pessoas deixam seus lugares. O roteiro, muitas vezes confuso e bastante acusador, não agradou a muitos dos espectadores.Exemplo: um ator português entrou em cena e criticou o modo de vida dos brasileiros, nossa falta de originalidade e como a única coisa sobre a qual as pessoas sabem conversar hoje em dia é a novela das oito. Bem corajoso da parte dele.
Depois de quase duas horas, e mais uns 20 assentos vazios, todos saem de cena. O velho ator sobe ao palco, trazendo uma cadeira. A equipe de produção desce uma corda com um laço. O homem sobe na cadeira e coloca o laço ao redor de seu pescoço. As luzes se apagam. Silêncio. Aplausos.Silêncio.
Suspeito que quando as luzes voltaram a se acenderam, momentos depois, o que deveria ter acontecido foi programado de forma bem diferente. Mas o fato foi que quando as luzes se acendera, o velho estava dando seus últimos espasmos, ainda com a corda ao redor do pescoço. 
O público ficou agitado. Gente apareceu de todos os lados para descer o ator e verificar se ele estava bem. Tarde demais.
Que ato final incrível. Clichê talvez, mas ainda assim excelente e único. Fiquei feliz de ter conseguido os ingressos para a estreia. Acho que essa peça não vão ficar muito tempo em cartaz.

Nenhum comentário: