segunda-feira, dezembro 20, 2010

Quando eu mudei pra SP, passei a primeira semana em SP sozinho num apartamento sem móveis ou televisão, dormindo num colchão inflável. A única coisa que eu tinha era meu notebook e tempo de sobra. Então eu ficava escrevendo todo tipo de coisa, achei esses dias esses dois textos, à la Manuel Bandeira ou Mario Quintana. Os dois refletem sobre São Paulo e sair de casa e são assinadas pelo meu pseudônimo Augustus Viracopos....

Pirâmide Social

Dirigir em São Paulo é uma prova de paciência
Mas não dá nem pra reclamar já que é só olhar para qualquer lado
Que se testemunham histórias em que a vida tem ainda menos clemência

Ao fechar do semáforo
Três crianças formam uma pirâmide humana
Desviar o olhar parece desaforo
Elas praticam malabarismo em troca de esmolas

Em uma calçada nos arredores
A mãe dos garotos espera encostada junto a uma lata de lixo
Em sua barriga encontra-se em gestação sua próxima vítima
Dentro de poucos meses ela nascerá para disputar sua comida com roedores

Algumas quadras mais â frente
um motorista que ignorou a arte circense
Entrega uma moeda para um adolescente recém-ingressado em uma faculdade particular

Nas aulas de história sempre se fala a respeito da tal pirâmide social
Mas a lição aprendida nas ruas é muito mais radical



Cérebro de passarinho

Se debaixo das asas maternas é tão mais seguro
E o alimento previamente triturado tão mais saboroso
Por que é que um dia eu me arriscaria a voar

Não que eu não fantasie com a idéia de lançar-me do ninho
Permitindo que o vento finalmente acaricie minhas penas
Tendo cada dia uma nuvem diferente como amante
Que chore lágrimas doces ao me ver partir

Mas fora daqui tudo é tão diferente e confuso
E se o céu decidir que não sou digno de seus domínios e arremessar-me
Nas formas abstratas do concreto abaixo
Se eu nunca mais encontrasse o caminho de volta para meu lar
Não suportaria viver sem o canto de meu pai para me confortar

Outro dia talvez eu experimente, hoje não
Logo meus genitores devem retornar com minha refeição
Já vejo ao longe um vulto aproximar-se em minha direção
Não, não são eles, é um gavi....

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